terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

Tapar o sol com a peneira

Vejo o Referendo ao Aborto como uma questão de especial importância para o país e para o seu desenvolvimento… E é com grande desagrado e até espanto que me tenho deparado com muitos dos argumentos do Não.

Podemos dissecar este problema em várias outras questões: É justo que uma mulher seja julgada por ter feito um aborto? É justo que essa mulher vá para a cadeia? Penso que todos concordam que não… Nisso se vê a própria hipocrisia da lei actual que vê no aborto um crime, mas que mesmo assim não condena quem o pratica. Ou seja, a própria lei não é aplicada. Depois os responsáveis por fazerem cumprir a lei, sabem, com toda a certeza onde são as clínicas onde o aborto clandestino se faz e quem são os seus donos, mas quanto a isso nada é feito… Ninguém é punido. A propósito disto, fiquem com a curiosidade: uma das caras da campanha do Não na zona do Porto, é nada mais nada menos que o Dr. Eduardo Dantas, que durante anos manteve uma clínica ginecológica onde o aborto clandestino era o prato do dia…

Mais: se houver a vitória do Não, o aborto vai deixar de existir? Todos sabemos que não. E porque não colocarmo-nos por um segundo que seja na pele de uma mulher que, clandestinamente ou não, vê o aborto com a única opção… E se o vai mesmo fazer, porque não num estabelecimento de saúde legalmente autorizado e com os cuidados básicos de saúde, que são um direito de todos?

O argumento mais forte do Não e o que convence muitas pessoas é o argumento da Vida… Mas essas vidas que tanto se tenta proteger, vão perder-se na mesma, mas na clandestinidade. E se é assim, porque não defendem a alteração da lei actual? Uma vida de uma criança com Trissomia 21 é menos válida do que a de uma criança saudável para vocês? Ou a de uma criança fruto de uma violação? Porque é que não se fazem funerais às vidas que se perderem em abortos espontâneos? Onde está aqui essa moral de defesa intransigente da vida?

Votar Não é dizer que o estado actual das coisas é o ideal. Votar não é tapar o sol com a peneira.

Por isso deixemo-nos acima de tudo de hipocrisias e façamos alguma coisa!!!

9 comentários:

EA disse...

Primeiro de tudo: sim, acho justo que uma mulher seja punida pela prática de aborto, bem como o marido, se essa foi decisão conjunta, bem como o médico. os primeiros dois por cumplicidade e o segundo por homicidio. para mim é muito claro: matar é matar. se uns matam pessoas ca fora, outros matam dentro da barriga o que ainda é pior, porque nem há defesa.
Segundo: o aborto clandestino é uma realidade e as pesosas que o fazem estao cheias de dinheiro. certo. a droga é uma realidade e os traficantes estão cheios de dinheiro, a morte paga é uma realidade e quem o faz está cheio de dinheiro, o roubo é uma realidade e quem o faz está cheio de dinheiro. qual é a diferença?nenhuma. legalizemos a droga e o roubo. ao menos as pessoas podem faze-lo em condições, em casas de chuto e os que são assaltados não sofrem, já que é consentido por lei..até podem achar a analogia ridicula, mas para mim os crimes são identicos...eu tb acho compreensivel que um pai mate o violador de um filho, por exemplo...dai que compreendo certas situações , mas legalizar vai permitir essas e muitas mais..nao veem isso?
quanto à lei já disse o que tinha a dizer..ninguém é a favor da lei, mas antes isso (e eu sou mesmo sensivel as situações em causa) que legalizar de vez, para que essas situações sejam compreendidas...
façam como quiserem..eu voto nao...

Mariana disse...

A prostituição também é ilegal e efectivamente as prostitutas não vão para a cadeia por isso. Então vamos legalizar também a prostituição? Esta já seria outra questão para debater, mas devo dizer que seria mais legítimo legalizar a prostituição do que o aborto, porque aqui está em causa a liberdade de escolha face à vida de cada um, e não a liberdade de escolha face à morte de outrém.

Cris disse...

Não percebo esta comparação, nem esta intolerância. Um crime para mim é um acto motivado pela violência, pela agressividade, pela má intenção. O que está por detrás de um aborto é um acto desesperado, um acto sofredor. Não questiono o valor da vida e é um argumento totalmente válido, mas quem se diz tão pela vida, sinceramente devia ter mais compaixão. Então uma mulher que aborta porque não tem outra solução, porque se vê forçada a fazê-lo, é igual a alguém que nos assalta, nos viola ou nos agride? Francamente... Mesmo que a mulher faça o aborto por uma questão frívola (e custa-me conceber a ideia de a mulher faz aborto sem remorsos mas ok) facto é que ela ao fazer um aborto está a tomar uma opção que tem a ver com o corpo dela, com a consciência dela e que, em última instância, é a vida dela que vai afectar. A mim, como indivíduo na sociedade, ela não me faz mal, não põe em questão a minha segurança ou o meu bem estar como os criminosos que vocês referiram. Tudo bem que é errado e condenável, mas agora comparar o aborto com estes crimes acho que é fazer uma comparação cruel e insensível. Concordo com muitos arguemntos do NÂO, mas com este não mesmo.

Só para terminar, o aborto é despenalizado na maioria dos países europeus e no mundo inclusivamente. A Rússia foi o primeiro país a despenalizar o aborto, em 1924!!!! Estes países andam a promover o crime, é isso?

Daniela Rodrigues disse...

Acho que esta questão é demasiado sensível, demasiado séria e demasiado complexa para ser comparada com a pena de morte ou a prostituição.

A questão da prostituição prende-se sobretudo com a profissão. Legalizar a prostituição passaria essencialmente por profissionalizar, em vez de prostitutas seriam por exemplo "trabalhadoras de sexo". Uma profissão igual às outras da área da prestação de serviços, com direito a recibos e tudo.

Voltando ao tema do aborto, vocês vêm a mulher como uma barriga de aluguer, e isso não aceito. O NÃO tem de facto alguns argumentos válidos mas este é hipócrita e só me faz lembrar os padres.

RC a questão do Dr. Eduardo Dantas apenas vem acrescentar mais uma incongruência à extensa lista redigida pelo NÃO nos últimos dias.

Ás defensoras do NÃO, em poucas palavras a RC mostrou a hipocrisia do argumento DIREITO VIDA. E por estar muito bom, passo a transcrever:

"Uma vida de uma criança com Trissomia 21 é menos válida do que a de uma criança saudável para vocês? Ou a de uma criança fruto de uma violação? Porque é que não se fazem funerais às vidas que se perderem em abortos espontâneos? Onde está aqui essa moral de defesa intransigente da vida?"

Dá que pensar, não?

EA disse...

eu nao quero entrar em discussoes, mas desculpa-me RC, mas nenhum dos argumentos que a DR transcreveu sao, na minha opinião válidos:
1-Uma vida de uma criança com Trissomia 21 é menos válida do que a de uma criança saudável para vocês? Ou a de uma criança fruto de uma violação?" já expliquei que as pessoas do nao não são a favor destas situações,mas dada a sensibilidade destas e , na minha opinião, serem os argumentos mais fortes do sim, ok, são situações extremas...voces defendem isso e muito mais..nos so isso.
2- "Porque é que não se fazem funerais às vidas que se perderem em abortos espontâneos?" nao sei..nao se fazem? para onde vai o feto?para o caixote do lixo?nao sei..também não tou pa me informar, mas nao percebo o argumento..é uma morte natural...

Diana Silva disse...

Bolas! Nós não defendemos nada disso. A sério, vamos mostrar que somos profissionais da comunicação ao percebermos, efectivamente, o que está aqui em discussão: despenalização das mulheres.

O único argumento que o Não pode dar perante isto é que considera estas mulheres criminosas e que portanto merecem ser punidas.

O que não deixa de ser incoerente porque estão a aceitar uma lei ineficaz e que não tem resultados práticos, o que significa que a maioria dessas mulheres não é presa!

A posição do SIM apenas aceita que as coisas sejam assumidas como se passam. Aí sim está um argumento muito válido da RC.

Cris disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Cris disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Cris disse...

Sublinho a opinião da RC e da DS e acrescento que, mais uma vez, trata-se aqui de ser racional e pragmático. O que o NÂO argumenta constantemente é que o aborto é uma questão moralmente inaceitável. E o SIM concorda com isso. Mas não estamos aqui para discutir uma moral, mas uma lei! Dizer NÂO é aceitar a lei como ela está agora. E acho que é claro como água dizer que a lei, como está, não funciona e nem é aplicada.

EA, mais uma vez, em relação às drogas, é uma comparação que não tem razão de ser. Seja pelas motivações, pelas consequências, pelo acto em si. E legalmente falando, não se está aqui a questionar a lei sobre as drogas. Não ouves todos ds dias na televisão e nos jornais rusgas e pessoas que vão presas por traficar droga? A droga é um mal que corrompe a nossa sociedade mas que está a ser combatido, bem ou mal, mas está. Achas que o mesmo se sucede com a lei do aborto? Sejamos francas. Não!

Para terminar, repito, a lei regulariza. Não obriga a nada. Não abriga ninguém a abortar. Quem faz um aborto agora não deixa de o fazer por causa da lei proibir. Quem não o faz por convicção moral, também não o fará depois da despenalização. Dito isto, vamos pelo menos viver num mundo às claras.