domingo, 28 de fevereiro de 2010

O limite

Sempre fui acérrima defensora dos jornalistas. Quando nos almoços de família presencio ataques ao suposto sensacionalismo trágico das redacções do nosso país, insurjo-me em defesa desse grupo profissional ao qual não pertenço (na verdadeira ascensão da palavra) mas que terá sempre um cantinho especial na minha vida (não só por ter partilhado com alguns desses profissionais alguns anos da minha formação mas porque tenho a sorte de ter alguns deles como amigos).

É verdade. A imprensa tem tendência para investir no carácter espectacular dos acontecimentos, não fosse esse, aliás, um dos principais factores-notícia. Aposta no "puxa-a-lágrima" de um desastre familiar, nas imagens impressionantes de carros completamente esmagados após um acidente automóvel, nas afirmações provocadoras da personalidade x ou y. E o público vai alimentando essa teia noticiosa, porque no fundo é o que queremos ver. Se mudassemos de canal quando passa uma notícia sem sentido ou não comprassemos o jornal xpto por se esquecer da integridade, as empresas jornalísticas seriam obrigadas a mexer. Mas tal não acontece e como tal os jornais, rádios e televisões limitam-se a acompanhar o mercado. É legítimo e perfeitamente natural. Até aí tudo bem.

O problema é quando a integridade se perde perante tentativas desesperadas de vender mais umas edições ou conquistar mais 10% de audiência. A divulgação de uma imagem da tragédia na Madeira fez-me repensar essa minha posição de defender os órgãos de comunicação como meras empresas que se limitam a procurar vender o produto.

Sempre me ensinaram que o público também se educa, e quando se difunde uma fotografia de um cadáver coberto de lama na primeira página de um jornal (o qual, aliás, já me tinha revoltado com a insensibilidade de uma fotografia que exibia as pernas de miúdas de 16 anos como se se tratassem de escombros), acho que está na altura de meditar um pouco nisso. É preciso vender, mas é preciso saber vender também. Acredito que saiba bem o dinheiro em cima da mesa de cabeceira, mas nem tudo é permitido para o conseguir. E esquecer que naquela imagem está o pai de alguém ou o filho perdido é perder, realmente, a noção do aceitável. Pior ainda, é perder a humanidade. E a partir daí, não me parece que haja retorno possível.

2 comentários:

Cris disse...

A capa da Visão desta 5ª feira é ainda pior (se é que é possível) que a capa do JN que referes. Na Visão vão ao ponto de mostrar a cara de um homem completamente enlameado e sem vida... Já a Sábado (que, já agora, quer em conteúdos, quer em imagens, tem batido a Visão ultimammente) mostra uma excelente foto. Um homem de costa a ser salvo no meio da força da enxurrada... É assim que se representa uma calamidade. Não é necessário chocar as pessoas...

Daniela Rodrigues disse...

Di tens toda a razão, ainda um destes dias me insurgi contra a quantidade de lixo que se vê nos MCS de cada vez que há uma catástrofe!

É uma decadência de facto, e é triste vermos pessoas a ficarem gordas à custa da desgraça alheia.

P.S. Posta mais vezes ;)